sexta-feira, 13 de julho de 2012

Da parte sentimental: O cheiro das pastas de plástico na pré-escola


Viver em outra cultura e em outro país é um desafio diário! Sair do seu sofá e da sua televisão e estar bem em não ter acesso a um sofá e uma televisão por meses, ou simplesmente passar anos sem comer a comida da sua mãe. Aquela mãe, de origem, não as que você encontrou no meio do caminho, que também te trataram como filho. É ver o tamanho do ser humano como espécie, e o tanto de amor que pode sair de dentro de nós e observar isso nas outras pessoas que nos adotam ao longo do caminho. É saber que existem seres humanos que nivelam por baixo, e que não te oferecem o básico, um sorriso ou uma mão estendida e passar por eles, com muita paciência. É viver paisagens de montanhas, rios, matas, animais silvestres, frutas, comidas, cores, construções, cheiros, sabores, poluições em geral, costumes. Um café da manhã com batata e queijo, um café que é de cevada e chamado de café, nomes de pessoas compostos impronunciáveis e que lembram novelas mexicanas, escritores que falam sobre a cultura que você vive no dia dia, pessoas que não dizem obrigada, nem tchau, que vivem uma vida sofrida de turismo e de oferecer serviços, que muitos não querem comprar.  Pessoas apressadas caminhando por todo lado, pessoas sorrindo sempre com seus sorvetes na mão, restaurantes sempre cheios, muita carne e batata nos pratos, consumo gigante de informalidade: no trabalho, nas empanadas, nos sucos de frutas, nos queijos de sabores diversos, nas milhares de verduras vendidas no chão, sob o sol. Há que ter vontade e mente desafiadora, para viver por tanto tempo em uma realidade que não seja a sua, em outro país, quem sabe.  Como tirar o melhor proveito de um povo ressentido e conservador? O grande desafio é viver harmonicamente numa rotina diária de coisas diferentes e novas, como se você pudesse se misturar com a água corrente, e ser incolor e inodora, como ela. Ou se mesclar as cores da multidão e pertencer a multidão. Ou ainda melhor, falar a língua deles, e ser como eles. Tudo se torna mais gostoso quando finalmente, você consegue se integrar, fazer parte do mesmo saco de batatas. O simples fato de ter uma torneira e dela sair água, não significa que você pode beber, tomar banho ou escovar os dentes com ela. Em outras situações, não haverá torneira, e tomar banho sem chuveiro, é uma realidade muito presente. Água quente em um país frio? As vezes não tem. Parece simples, é realmente é. A questão é a forma de adaptação a tudo isso e o que você espera das situações. O melhor de tudo, é viver o quanto mais o presente, e não se preocupar tanto com suas expectativas. As expectativas são os únicos sentimentos que podem destruir sua experiência. A falta de pés no presente, e de observar as situações como pessoa presente no momento aqui e agora, te tira do momento de viver a experiência. O melhor mesmo é estar atento ao que mais consome energia da cultura do outro país, e tentar entender e aceitar a realidade. Criticar, achar estranho, se incomodar, são atitudes típicas de quem está em choque cultural. O choque cultural para mim, é quando você se encanta demais, ou está achando tudo muito estranho e ruim, o que te impede de compreender a situação, e somente faz juízos de valor, comparações com a sua vida anterior e com o seu país, sobressaindo até o que você antes não dava valor. Isso passa... mas depende da sua atitude! Por um lado, é o grande crescimento para algumas pessoas: a possibilidade de valorar coisas antes imperceptíveis. Como por exemplo, quando imaginei eu, que ia dar valor a uma roupa de cama limpa, aos convites para almoços de domingo, a sair na rua e encontrar pessoas conhecidas, a simples conversas sinceras, a um barzinho a noite, a coisas simples, como uma rotina fixa. Tudo isso faz muita falta, e na rotina, elas passam sem perceber. O grande desafio é na real, poder estar aberto a conhecer o outro país, e isso vai implicar em muito autoconhecimento e aceitação das suas próprias atitudes, rédea nas mãos para controlá-las e aceitação do país. Um crescimento que vem cheio de novas descobertas, como uma criança aprendendo o caminho da escola, com sua mochila, sua lancheira e um caderno em branco, e depois de anos passados, só se recorda do nome da professora, e do cheiro das pastas de plástico, na pré-escola.

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